ABSURDO: A MP 1045 e o fim da gratuidade da Justiça

Por Valete Souto Severo*

O PLC 17 que resulta do texto de conversão da MP 1045 em projeto de lei não se limita às regras originais dessa medida, que já são péssimas, pois autorizam redução de salário e suspensão de contrato em plena pandemia. Retiram, portanto, capacidade de consumo e a possibilidade de viver de modo saudável, em um contexto no qual a média salarial não passa de R$ 750 em algumas regiões do país. O PLC traz também três novas formas de contratação, sob a mesma lógica do trabalho intermitente: o pagamento é apenas do período trabalhado e não há garantia de um mínimo de horas por mês. Férias e gratificação natalina são, na prática, suprimidas, pois a previsão é de pagamento mensal dessas rubricas, de forma proporcional às horas trabalhadas. Se não houver trabalho, não há pagamento. E se houver, o pagamento será inferior àquele previsto na legislação vigente. Hoje, porém, não vou tratar dessas questões.

Vou tratar da proposta de alteração contida nesse mesmo projeto de lei para as regras da gratuidade. Há poucos dias, artigo publicado no Espaço Vital referia-se à situação de uma mulher trabalhadora, a quem foi negado o direito à gratuidade da Justiça. Desempregada, condenada a pagar custas, essa cidadã não pôde recorrer da decisão proferida em seu processo. Algo que tem se repetido nas Varas do Trabalho do país inteiro. Há alguns meses, um trabalhador que denunciou a prática de racismo – obrigado a cortar o cabelo que usava em estilo black power, cumpriu essa imposição por duas vezes; na terceira, negou-se a fazê-lo, e foi despedido, também foi penalizado. O TRT do Paraná, apesar da perícia realizada no processo demonstrando que o cabelo do trabalhador não interferia no uso do capacete, entendeu que a empresa “apenas teve o zelo de preservar pela segurança do empregado”. Julgou improcedente o pedido e condenou o trabalhador a pagar custas de R$ 9.904,56 e honorários de R$ 49.522,80 para o advogado da empresa. Não são casos isolados.

A possibilidade de condenar quem é pobre a pagar custas e honorários aparece no texto da CLT com a chamada “reforma” trabalhista, em 2017. É resultado de um movimento explicitado no Documento 319 do Banco Mundial. Lá há expressa orientação para que os “programas de reforma do Judiciário” revejam suas normas sobre custas e honorários “determinando se são suficientemente altas ao ponto de deter demandas frívolas e condutas antiéticas”. A regra alterada no texto celetista é objeto de uma ação junto ao STF, mas até hoje a ADI 5766 não foi julgada. O que dessa omissão resulta é a aplicação cotidiana de dispositivos que ferem a literalidade da Constituição da República, afinal há no artigo 5º o dever fundamental do Estado de prestar “assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”. Uma parte da magistratura trabalhista, cujos membros juraram cumprir a Constituição, vem aplicando esses dispositivos, trazendo como resultado concreto a mais eficiente fórmula de vedação do acesso à Justiça.

Isso, porém, não parece ser suficiente no contexto de desmanche em que estamos vivendo. O PLC 17/2021, que tramita em regime de urgência no Parlamento brasileiro – já foi aprovado pela Câmara e enviado ao Senado – altera novamente as disposições legais, para exigir comprovação de inscrição em programa do governo federal como única prova possível da condição de pobreza. Além disso, reforça a possibilidade de condenação ao pagamento de despesas processuais, inclusive com eventuais créditos que a trabalhadora ou o trabalhador receber naquele ou em outro processo, mesmo para quem for reconhecidamente pobre. A previsão é de alteração da CLT, do CPC e das leis dos juizados federal e estaduais, cível e penal. É o fim da gratuidade em todas as formas de acesso ao Poder Judiciário, com o claro propósito de impedir quem é pobre ou está sem emprego de obter tutela jurisdicional.

No âmbito das relações de trabalho isso é ainda mais grave. A Justiça do Trabalho surge historicamente para garantir acesso à Justiça. O Decreto que a institui, ainda na década de 1930 do século passado, refere que o Estado não pode ser neutro “diante das perturbações sociais”. Deve, ao contrário, assumir a posição de garantidor da efetividade dos direitos, através de um procedimento simples, ágil e gratuito. A gratuidade integral, que em 1988 é consagrada como um direito fundamental, está lá na gênese do processo trabalhista. Destruí-la é bem mais do que promover uma alteração legislativa lesiva à classe trabalhadora. É instituir um novo discurso.

Esse novo discurso é avesso aos direitos sociais em geral, e ao Direito do Trabalho em especial. Pretende a extinção da Justiça do Trabalho. Isso não é pouco. Afinal, com todos os problemas que enfrenta, a Justiça do Trabalho é o único lugar de fala da classe trabalhadora. Não há outro modo de realizar direitos trabalhistas, especialmente em uma sociedade na qual o desemprego já atinge 20 milhões de pessoas. É apenas através da Justiça do Trabalho que se obtém, muitas vezes, acesso ao seguro-desemprego, ao FGTS, às verbas resilitórias, às horas extras. No limite, a extinção da gratuidade em todos os âmbitos da Justiça tem por finalidade a extinção do Poder Judiciário tal como o conhecemos. Esse poder, que ao longo do Século XX afirmou-se como o “guardião das promessas” do Estado Social, tornou-se intolerável ao capital.

E para quem considera alarmista tal afirmação, sugiro refletir sobre as demais alterações que vêm sendo propostas e incluídas no ordenamento jurídico. Dentre elas, destaca-se o incentivo à conciliação, especialmente àquela extrajudicial, que afasta completamente o Estado de sua função social, jogando as pessoas a própria sorte. Dificulta-se o ajuizamento de demandas judiciais e, ao mesmo tempo, valorizam-se “formas alternativas de resolução dos conflitos”, inclusive com o apoio explícito e o uso da estrutura do próprio Poder Judiciário para negar sua razão de existência. Está lá, também, no Documento 319, a afirmação de que “a morosidade, ineficiência e corrupção têm estimulado os litigantes a evitar completamente o sistema Judiciário” e a forma proposta para solucionar isso é o estímulo à “resolução de conflitos extrajudiciais”. O que não está dito, nem poderia, é que esse é o caminho mais curto para a redução da função do Poder Judiciário, com a eliminação de instâncias que de algum modo podem tensionar as ambições do “mercado”. A Justiça do Trabalho, não por acaso, é o primeiro alvo, mas certamente não será o último, pois um Judiciário “facilitador e regulador das atividades de desenvolvimento do setor privado”, como refere o mesmo documento, é uma contradição em termos.

Essa é uma estrada que compromete o projeto de nação explicitado no texto da Constituição da República. Compromete nossa soberania, nossa possibilidade de viver bem. E nos atinge a todos, pois a ausência de acesso à Justiça em uma sociedade organizada como a nossa representa, concretamente, a ausência de direitos. E a ausência de direitos se materializa na fome, na violência, na privação, no adoecimento e na morte. O que agora se promove contra a classe trabalhadora, logo atingirá quem se sente imune a tais agressões. Quando as garantias de quem julga também forem ceifadas, será que haverá cumplicidade?

Cada decisão que condena quem está desempregado ou é pobre a pagar custas e honorários ajuda a destruir a sociabilidade possível, gestando uma realidade na qual ninguém está a salvo.

O PLC 17 de 2021, também por isso, precisa ser rejeitado.

  • Valdete Souto Severo é doutora em Direito do Trabalho pela USP/SP, juíza do trabalho no Tribunal Regional do Trabalho da Quarta Região, professora de Direito e Processo do Trabalho da UFRGS e escritora.

FONTE: CTB

Trabalho sem férias, 13º e FGTS: o que a nova reforma traz de retrocessos

Está em discussão no Congresso um projeto que muda uma série de regras para os trabalhadores, em uma nova reforma trabalhista, quase quatro anos após a reforma feita pelo governo Michel Temer. A proposta de agora, do governo Bolsonaro, já foi aprovada pela Câmara e aguarda votação no Senado.

O texto do deputado Christino Áureo (PP-RJ) recebeu críticas por promover, sem discussão, mudanças permanentes e perdas enormes nas leis trabalhistas (CLT).

Veja algumas das principais mudanças da nova reforma trabalhista:

  • cria uma modalidade de trabalho sem direito a férias, 13º salário e FGTS;
  • cria outra modalidade de trabalho, sem carteira assinada (Requip) e sem direitos trabalhistas e previdenciários; trabalhador recebe uma bolsa e vale-transporte;
  • cria programa de incentivo ao primeiro emprego (Priore) para jovens e de estímulo à contratação de maiores de 55 anos desempregados há mais de 12 meses; empregado recebe um bônus no salário, mas seu FGTS é menor;
  • reduz o pagamento de horas extras para algumas categorias profissionais, como bancários, jornalistas e operadores de telemarketing;
  • aumenta o limite da jornada de trabalho de mineiros;
  • restringe o acesso à Justiça gratuita em geral, não apenas na esfera trabalhista;
  • proíbe juízes de anular pontos de acordos extrajudiciais firmados entre empresas e empregados;
  • dificulta a fiscalização trabalhista, inclusive para casos de trabalho análogo ao escravo.

Parte das medidas incluídas pelo relator foi tentada por Bolsonaro nos primeiros meses de 2020, na medida provisória do “Contrato de Trabalho Verde Amarelo”. Como ela não seria aprovada a tempo pelo Congresso e perderia validade, o governo revogou a MP em abril de 2020. Desde então, o governo trabalha para recriar as medidas.

ABAIXO, A LISTA ENORME DE RETROCESSOS

Sem carteira nem férias, 13º salário e FGTS

O governo cria uma nova forma de contratação, por meio do Programa Nacional de Prestação de Serviço Social Voluntário. Nesse regime, o trabalhador não tem direito a salário, férias, 13º salário e FGTS. Poderá receber apenas vale-transporte.

Pelo texto aprovado, o programa terá duração de 18 meses e será destinado a jovens com idade entre 18 e 29 anos, além de pessoas com mais de 50 anos. Caberá aos municípios criar e oferecer as vagas, com base em um regulamento que será editado pelo Ministério do Trabalho e Previdência.

Quem aderir ao programa terá uma jornada máxima de 48 horas por mês, para desempenhar as atividades do programa. Contudo, a jornada deve ser de até seis horas por dia, por no máximo três vezes na semana.

O programa permite que prefeituras possam contratar temporariamente pessoas para serviços e, em troca, pagar uma remuneração, que não pode ser inferior ao salário-mínimo hora (cerca de R$ 5). A União poderá ajudar nesse pagamento, em até R$ 125 por mês.

Segundo o projeto, as prefeituras não podem realizar esses contratos temporários para atividades de profissões regulamentadas ou de cargos e empregos públicos.

Programa para jovens, com FGTS menor

Quem poderia ser contratado

O relator cria o Priore (Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego), para jovens entre 18 e 29 anos em busca do primeiro emprego e maiores de 55 anos sem emprego formal (carteira assinada) há mais de 12 meses.

O Priore considera que ainda estão em busca do primeiro emprego pessoas que tiveram apenas contrato de aprendizagem, de experiência, de trabalho intermitente ou de trabalho avulso.

Limite de salário

O programa valeria para empregados que recebam até dois salários mínimos (atualmente R$ 2.200).

Bônus de até R$ 275

O programa prevê um Bônus de Inclusão Produtiva (BIP), pago pelo governo e proporcional à carga horária. O maior BIP seria de R$ 275 (25% do salário mínimo) ao empregado contratado para trabalhar 44 horas semanais (o máximo permitido pela CLT).

Prazo para contratar e duração do vínculo

A contratação poderá ser feita até 36 meses após a publicação da lei (que ainda não foi aprovada nem sancionada). O contrato poderá ter duração máxima de 24 meses.

Vale só para novos contratos

A contratação seria exclusiva para novos postos de trabalho, limitada a 25% do total de empregados. Empresas com até 10 empregados poderiam contratar três funcionários pelo Priore.

Direitos do empregado

O empregado manteria todos os direitos trabalhistas previstos na Constituição e na CLT, como férias, 13º salário, adicional de hora extra e descanso semanal remunerado. O empregado no Priore receberia todo mês o valor proporcional ao 13º salário acrescido de 1/3 (terço de férias).

FGTS e multa menores

Em contratos normais da CLT, a empresa deposita todo mês um valor igual a 8% do salário bruto na conta do FGTS do empregado. Para trabalhadores do Priore, esse repasse seria menor, de 2% a 6%, conforme o tamanho da empresa (veja detalhes abaixo).

Ao final do contrato, o empregado receberia o valor de multa de 20% do FGTS proporcional ao tempo de trabalho, independentemente do motivo da rescisão (com ou sem justa causa ou acordo entre empresa e trabalhador). O valor é menor do que a multa por rescisão sem justa causa na CLT (40%).

Vantagens para a empresa

O Priore reduziria a contribuição para o FGTS do trabalhador (que é de 8% na CLT) conforme o tamanho da empresa:

  • 2% para microempresa
  • 4% para empresa de pequeno porte
  • 6% para as demais

As microempresas ficariam dispensadas de recolher as contribuições para o Sistema S nos contratos do Priore.

Qualificação profissional

Os trabalhadores contratados por meio do Priore terão prioridade em ações de qualificação profissional. O texto do relator deixa a cargo do Ministério da Economia detalhar esses treinamentos.

Emprego sem carteira e sem direitos trabalhistas

Quem poderia ser contratado

Pessoas entre 18 e 29 anos; ou trabalhadores sem emprego formal (carteira assinada) nos dois anos anteriores; ou inscritos no Cadastro Único para programas sociais, com renda mensal familiar de até dois salários mínimos (R$ 2.200 hoje).

Sem vínculo de emprego

Empregador, trabalhador e entidade responsável pelo curso de qualificação assinam digitalmente um Termo de Compromisso de Inclusão Produtiva (CIP). Esse termo não cria vínculo de emprego. Portanto, não há carteira assinada nem direitos trabalhistas e previdenciários.

Direitos do trabalhador

  • Vale-transporte;
  • Recesso de 30 dias quando houver a renovação do contrato por um ano;
  • Seguro contra acidentes pessoais.

Jornada de trabalho limitada

A jornada de trabalho no Requip seria de até 22 horas por semana (metade do limite da CLT). A jornada diária pode ser de oito horas —nesse caso, a pessoa poderia trabalhar no máximo dois dias e meio para não extrapolar a carga semanal. Não seria permitida a realização de horas extras.

Até R$ 550 para o trabalhador

O trabalhador receberia dois benefícios diferentes: BIP (Bônus de Inclusão Produtiva) e BIQ (Bolsa de Incentivo à Qualificação). Não seria descontado Imposto de Renda ou outros tributos sobre esses valores.

O BIP seria pago pelo governo ao empregado, no valor de até R$ 275. A BIQ seria paga pelo empresário, com valor igual ao BIP. Os benefícios somados chegariam a R$ 550 por mês para quem trabalhar 22 horas semanais.

Duração do contrato

Um ano, prorrogável por mais um. Para pessoas com deficiência não haveria limite de duração.

Quem poderia contratar pelo Requip

  • Empresas;
  • Profissionais liberais de nível superior;
  • Produtores rurais pessoas físicas.

Quantos trabalhadores poderiam ser contratados

O limite de contratados por empresa começa em 10% do número de funcionários no primeiro ano do Requip, sobe para 15% no segundo ano e termina em 20% no terceiro.

Empresas menores, com até 20 funcionários, poderiam contratar o equivalente a 20% já a partir do primeiro ano, se quiserem.

Cursos de aprendizagem

Os cursos para quem participar do Requip seriam oferecidos pelos serviços nacionais de aprendizagem: Sesi, Senai, Sesc, Senac, Sest, Senat, Sebrae, Senar ou Sescoop. Eles têm a opção de contratar instituições para prestar o serviço.

Os cursos teriam no mínimo 15 horas por mês.

A empresa que contratar pelo Requip também poderia oferecer diretamente o curso de qualificação, arcando com os custos.

Custos do programa para o governo

Na primeira versão do parecer, o Bônus de Inclusão Produtiva (BIP) seria custeado por um corte linear de 30% nas verbas do Sistema S (Senai, Sesc, Sesi, Senac e outros). Na versão votada no plenário da Câmara, as empresas poderão descontar para pagar a seus funcionários até 15% das contribuições que teriam que fazer a essas entidades.

Jornada de mineiros será alterada

O texto aprovado prevê diversas alterações na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). Em uma delas, muda a jornada máxima de trabalhadores de minas em subsolo, que atualmente é de seis horas diárias. A proposta determina uma jornada diária de até 12 horas, limitada a 36 horas semanais. O patrão e o empregado poderão negociar o prazo de descanso.

Restrição de acesso à Justiça gratuita

O acesso à Justiça gratuita também será limitado, conforme o texto aprovado. Só terão acesso ao benefício famílias carentes, com renda familiar mensal per capita de até meio salário mínimo ou renda familiar mensal de até três salários mínimos (R$ 3.300).

No caso de processos trabalhistas, o acesso à Justiça gratuita só será concedido a quem teve salário inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Se a regra já valesse hoje, apenas pessoas que tiveram salário inferior a R$ 2.500 poderiam requerer esse benefício.

Juiz não poderá anular cláusulas de acordos extrajudiciais
Juízes do trabalho ficam proibidos de anular cláusulas de acordos extrajudiciais entre empregados e empresas. Segundo o texto, o juiz ficará limitado a homologar ou não o acordo na integralidade e não poderá determinar ajustes entre as partes. A avaliação do juiz também será “exclusivamente sobre a conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico”.

Fiscalização sem multa e ‘orientação’ para escravagistas

O texto altera a fiscalização trabalhista, prevendo que empresas só podem ser multadas por infringir a lei depois de duas visitas de “orientação” de auditores do trabalho. A regra vale inclusive para casos de trabalho análogo ao escravo.

Redução de pagamento de horas extras

Caso a MP seja aprovada pelo Senado, bancários, jornalistas e operadores de telemarketing, entre outros trabalhadores com jornadas reduzidas (ou seja, de menos de oito horas por dia) terão redução no valor do pagamento de horas extras. O texto prevê uma “extensão da jornada” para oito horas diárias e determina que o pagamento da hora extra tenha acréscimo somente de 20% – hoje, a legislação trabalhista determina que a hora extra tenha acréscimo de 50% (quando trabalhada de segunda a sábado) e 100% (quando trabalhada domingos ou feriados).

(Com Agência Estado)

BOA NOTÍCIA: Novos estudos comprovam eficácia das vacinas contra variante delta

As vacinas disponíveis contra a covid-19 possuem grande eficácia contra a variante delta do coronavírus. A conclusão vem a partir de uma série de estudos realizados em diferentes países. Hoje (16) a agência governamental inglesa para a saúde pública (Public Health England) divulgou um levantamento com dados positivos acerca dos imunizantes disponíveis naquele país. Foram levados em conta dados de um cenário geral da população de vacinados, que representa mais de 65% com duas doses e 75% com uma.

Na Inglaterra, onde a variante delta já é dominante, a população recebeu vacinas da AstraZeneca e da Pfizer, também aplicadas em larga escala no Brasil. A cepa viral, até 70% mais contagiosa, circula de forma ainda reduzida no Brasil, mas avança com velocidade. No Rio de Janeiro, levantamento dos laboratórios LNCC (Laboratório Nacional de Computação Científica) e UFRJ/LVM (Laboratório de Virologia Molecular da UFRJ) já notam a prevalência em 56,6% da nova cepa nas amostras recolhidas neste mês.

No estudo, a agência não discrimina as efetividades por vacina, mas sim resultados gerais. Na média, a efetividade dos imunizantes contra a variante delta ficou em 35% para casos sintomáticos da doença com uma dose, e em 79% com duas. Nota-se que a cepa reduz a eficácia global das vacinas, especialmente quando contamina organismos que tenha recebido apenas a primeira dose. Entretanto, seguem com alto grau de proteção. Contra a variante alpha, menos agressiva, os indicadores são de 49% para as primeiras doses e 89% com o esquema vacinal completo.

As eficácias das vacinas são evidentes com a análise das curvas epidemiológicas dos países. Enquanto a variante delta elevou o número de casos e mortes nos Estados Unidos, que registra 46% dos adultos vacinados com duas doses, na Inglaterra, apesar do aumento expressivo nos casos, as mortes não acompanham a escalada.

Enquanto isso, no Brasil a vacinação avança de forma mais lenta. Apenas 24,68% dos brasileiros estão imunizados com duas doses. Pesa sobre o país a postura do governo federal na compra das vacinas, possível prevaricação e corrupção envolvendo contratos e o negacionismo do presidente Jair Bolsonaro, que rejeitou a ciência, divulgou mentiras sobre a segurança das vacinas e o uso de máscaras, além de ter promovido e incentivado aglomerações.

Contudo, mesmo que de forma tímida, os resultados já começam a aparecer. Hoje, o país registrou 434 mortos por covid-19, totalizando 569.492. O número de novos casos foi de 14.471. Ao menos 20.378.570 brasileiros foram infectados com o vírus desde o início do surto, em março de 2020. Desde o dia 12 de abril, as mortes e os casos passaram a recuar com velocidade no país. A média móvel de mortes, calculada em sete dias, está em 847, menor número desde o dia 7 de janeiro. O mesmo indicador dos casos está em 28.688, melhor marca desde o dia 18 de novembro do ano passado.

Outras vacinas
Além das vacinas da AstraZeneca e da Pfizer, os brasileiros também recebem os imunizantes CoronaVac e Janssen. O Instituto Butantan, responsável pela produção da CoronaVac, em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac, está conduzindo um estudo de eficácia da vacina diante da variante delta. Levantamentos com outras variantes apontam que a vacina possui eficácia de até 95% para evitar mortes. Entretanto, a imunidade provocada pelo fármaco reduz com o tempo, especialmente em idosos e imunossuprimidos. Por esta razão, cientistas apontam que uma terceira dose de reforço deve ser levada em conta.

A Tailândia, que também utiliza a CoronaVac, divulgou em agosto um estudo de eficácia do imunizante. As variantes analisadas foram a alpha e a delta, que circulam no país. Os resultados foram animadores. O levantamento do Ministério da Saúde Pública da Tailândia (MOPH) levou em conta 677.348 profissionais de saúde entre abril e junho. Com 14 após duas doses, a vacina apresentou eficácia de 90% contra a variante alpha e 75% contra a delta.

Um outro estudo divulgado na última semana por um programa do Departamento Nacional de Saúde da África do Sul (Sisonke) analisa a eficácia da Janssen. Foram avaliados 477.234 trabalhadores da saúde no país vacinados com o fármaco da Johnson & Johnson. A eficácia notada ficou em 71% contra internações e 95% contra mortes. Também foi avaliada a variante beta, que circula com intensidade no país. Foram evitadas 66% das hospitalizações e 91% das mortes.

Ação conjunta
Pesquisadores afirmam com segurança que as vacinas funcionam e devem ser o principal instrumento de superação da pandemia, mesmo com o perigo representado pela variante delta. Entretanto, nenhuma vacina é 100% eficaz. Logo, outras medidas não farmacológicas devem ser adotadas em paralelo, como uso de máscaras e distanciamento social. “Vacinas salvam vidas. Precisamos ampliar ainda mais a cobertura vacinal. Especialmente com a primeira dose, para já promover uma proteção para a população, mas crucialmente com a segunda, para aumentar substancialmente a proteção. E não esquecer que, enquanto a transmissão estiver elevada, usar máscaras, preferencialmente PFF2, em ambientes abertos e, principalmente, fechados. Fazer distanciamento físico sempre que possível. Preferira ambientes bem ventilados e abertos”, afirma a neurocientista e pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Mellanie Fontes-Dutra.

Os cientistas criticam o fim das pouco rigorosas medidas de isolamento social nas cidades e estados brasileiros. Em São Paulo, por exemplo, o governador João Doria (PSDB) vai suspender amanhã (17) todas as restrições aos horários de funcionamento e ao percentual de ocupação dos estabelecimentos comerciais. O governador também anunciou hoje a liberação de 100% de público para o Grande Prêmio Brasil de Fórmula 1, no autódromo de Interlagos, previsto para o dia 7 de novembro.

Mellanie questiona a pressa. “Todos aqueles que quiserem reabertura da sociedade deveriam ser os primeiros a cobrar medidas assertivas de fiscalização das medidas que protegem da transmissão e ampliação da vacinação, para a implementação de terceiras doses por aqui, por exemplo. Nosso maior problema é a transmissão. Precisamos necessariamente somar às vacinas as medidas que seguram muito a transmissão, como uso de máscara e distanciamento”, completa.

FONTE: RBA

ÀS CUSTAS DO POVO: Alta dos combustíveis garante R$ 31,6 bi a acionistas da Petrobras

Na última sexta-feira (13), entrou em vigor mais um aumento no preço da gasolina. A Petrobras anunciou reajuste de R$ 2,69 para R$ 2,78 o litro – alta de 3,34% –, no valor cobrado pelos combustíveis que saem das suas refinarias. No ano, a gasolina acumula avanço de 51%. Nos postos, o preço já ultrapassa R$ 6 o litro na maior parte do país. Segundo o IPCA-IBGE, em 12 meses a gasolina acumula aumento de quase 40%. Contudo, também na mesma semana, a estatal anunciou o pagamento antecipado de R$ 31,6 bilhões para os seus acionistas, relativo ao exercício deste ano. O lucro líquido registrado pela empresa no segundo trimestre foi de R$ 42,9 bilhões.

Para especialistas do setor energético, a alta dos preços dos combustíveis e a distribuição de dividendos bilionários ao mercado financeiro guardam íntima relação. São também resultado da política adotada pela Petrobras desde 2016, que atrela os preços praticados ao dólar e às cotações do petróleo no mercado internacional.

“Combustíveis mais caros para quem está mais pobre; lucros maiores para quem já é e está ficando mais rico”, sintetizou a economista-chefe do Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa (IREE), Juliane Furno. Em artigo publicado no site Brasil de Fato, ela aponta “contradição fundamental” no papel desempenhado pela Petrobras. Ao mesmo tempo em que nasceu vocacionada para atender os interesses públicos, como empresa mista, e não 100% estatal, tem outra face voltada aos interesses do mercado.

“O Estado brasileiro hoje fica com apenas 34% de todo o lucro gerado, enquanto os investidores externos são os principais beneficiários do lucro da companhia.”

De 2018 para 2019, por exemplo, o lucro distribuído aos acionistas cresceu 51%, “para a alegria dos representantes do ‘mercado’”, frisa Juliane. Já o aumento dos combustíveis, segundo ela, colabora para que todas as mercadorias também fiquem mais caras, estrangulando ainda mais o orçamento das famílias, que sofrem com a volta da fome, o desemprego e cortes de salários.

Forno a lenha

O sociólogo Rafael Rodrigues da Costa e o economista Eduardo Costa Pinto, pesquisadores do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), também explicam que o “recorde” de dividendos distribuídos aos acionistas se deu em função de “uma expressiva recuperação das receitas de vendas dos derivados, sobretudo o diesel, a gasolina e o GLP”. Em artigo publicado no portal UOL, eles também concordam que esse aumento é “reflexo” da política de paridade de preços internacionais adotada pela estatal.

Eles afirmam que a atual gestão da estatal, sob comando do general da reserva Joaquim Silva e Luna, tem colocado “o lucro acima de tudo” e os “acionistas acima de todos”. “Enquanto os acionistas agradecem, a população com menor renda passou a utilizar a lenha para cozinhar em substituição ao gás de cozinha. Quais são os limites da maximização dos lucros para os acionistas de uma empresa estatal? A atual gestão da Petrobras parece não ter nenhum.”

FONTE: RBA

Em Congresso que aprovou unificação com CGTB, Adilson é reeleito presidente da CTB

Com a eleição e a posse da nova diretoria, a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil, CTB encerrou neste sábado, 14, seu 5º Congresso Nacional – o Congresso Wagner Gomes. O bancário Adilson Araújo, da Bahia, foi reeleito presidente da central, enquanto o trabalhador dos Correios Ronaldo Leite, do Rio de Janeiro, assumirá a Secretaria-Geral. O Congresso também aprovou a unificação com a Central Geral dos Trabalhadores do Brasil, a CGTB.

Com mandato de quatro anos (2021-2025), a direção conta com sete vice-presidentes – Everaldo Braga (BA), Ivânia Pereira (SE), José Adilson (ES), Rene Vicente (SP), Ubiraci Dantas, o Bira (SP), Valéria Morato (MG), Vicente Selistre (RS) e Vilson Luiz da Silva (MG).

DESTAQUE PARA A PRESENÇA DAS MULHERES

Pela primeira vez na história da CTB, a direção executiva será majoritariamente feminina. De seus 73 integrantes, 38 são mulheres e 35, homens – um índice recorde de 52%.

Além de Celina Arêas (MG), reeleita secretária da Mulher Trabalhadora, a executiva terá como secretárias Eremi Melo (Formação e Cultura), Alaíde Bagueto (Políticas Sociais, Esporte e Lazer), Beatriz Calheiro (Políticas para a Juventude Trabalhadora), Lucimara Cruz (Políticas de Promoção da Igualdade Racial), Sandra Paula Bonetti (Defesa do Meio Ambiente e Saneamento), Elgiane Lago (Saúde e Meio Ambiente do Trabalho), Vânia Marques (Política Agrícola e Agrária) e Rosana Medina (Previdência, Aposentados e Pensionistas).

O 5º Congresso da CTB aprovou um Plano de Lutas para os desafios do período atual, com destaque para o enfrentamento aos retrocessos promovidos pelo governo Bolsonaro, a pandemia, e o fortalecimento das entidades sindicais. A programação foi semipresencial.

Centrais: ‘minirreforma’ aprovada na Câmara torna trabalhadores ainda mais vulneráveis

A Medida Provisória (MP) 1.045, aprovada no dia 10 de agosto no plenário da Câmara, que incluiu uma “minirreforma” trabalhista tornam os trabalhadores ainda mais vulneráveis, agravando as perdas sofridas na “reforma” de 2017, afirmam as centrais sindicais.

As entidades propõem que itens relacionados a criação e proteção de empregos sejam objeto de projetos de lei específicos, com a devida discussão prévia. “As novas medidas de flexibilização e afastamento dos sindicatos das negociações mais uma vez precarizam e aumentam a vulnerabilidade dos trabalhadores”, criticam os dirigentes.

Com isso, eles destacam a inclusão de vários temas estranhos ao assunto da MP, que tratava da renovação do programa emergencial em defesa do emprego, com medidas como suspensão ou redução da jornada e dos salários. Porém, o relator, Christino Aureo (PP-RJ), acrescentou diversos itens, os chamados “jabutis”.

Precariedade

Assim, a MP deveria ter como objetivo manter postos de trabalho por meio da redução de jornada e salário e da suspensão de contratos. “E não instituir programas que criam vagas de trabalho precárias, com menos direitos, além de alterar a legislação trabalhista existente e que assegura os direitos da classe trabalhadora”, acrescentam. Os bancários, por sua vez, criticaram especificamente emenda que mexe na jornada de seis horas da categoria e reduz adicional de horas extras.

“O enfrentamento do gravíssimo problema do desemprego depende, diretamente, da estratégia econômica orientada pelo investimento público e privado, pela sustentação da renda do trabalho e pelos mecanismos de proteção social.”, argumentam ainda os sindicalistas. Além disso, o presidente da CUT, Sérgio Nobre, lembra que os direitos trabalhistas já haviam sido “deteriorados” na “reforma” trabalhista de 2017. E usou o termo “escravidão” para se referir à MP 1.045.

A Câmara aprovou apenas o texto-base do chamado Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, faltando votar as emendas. Parte do seguro-desemprego será paga ao trabalhador que tiver contrato suspenso ou salário e jornada reduzidos. O valor depende de quanto for a redução.

Principais prejuízos

Em nota conjunta, as centrais ressaltaram alguns dos pontos da “minirreforma” trabalhista contida na MP que consideram mais prejudiciais aos trabalhadores:

  1. Possibilidade de o trabalhador com contrato de trabalho suspenso contribuir como segurado facultativo, conforme as alíquotas estabelecidas para o segurado obrigatório (art. 18 do PLV). É o empregador que deve pagar a contribuição previdenciária, e não o trabalhador, em momento de pandemia e dificuldades financeiras, com redução salarial.
  2. Instituição do Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego – Priore (arts. 24 e seguintes do PLV). O Programa traz à tona dispositivos da MP nº 905, a MP da Carteira Verde-Amarela. A alteração configura matéria totalmente estranha ao texto original da MP 1.045 e não guarda relação alguma com as medidas excepcionais e transitórias contidas no texto original.
  3. Criação do Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva – Requip (arts. 43 e seguintes do PLV) e a inclusão do Programa Nacional de Prestação de Serviço Social Voluntário. Também matéria estranha ao texto original da MP. “Embora o objetivo ‘social’ seja relevante, trata-se de um programa que promove a exploração da mão de obra, subvertendo o direito ao trabalho assegurado como direito social pela Constituição.”
  4. Alteração de vários artigos da legislação trabalhista atual, recuperando dispositivos da MP nº 905 e da MP nº 927, também matérias estranhas ao texto original da MP nº 1.045. As centrais sindicais reiteram que o objetivo da MP nº 1.045 é reeditar as regras da MP nº 936, de 2020, com fins de garantir a redução de jornada e salários e a suspensão de contratos, para assegurar a manutenção de postos de trabalho durante a crise sanitária causada pela pandemia. Em vez disso, institui programas que criam vagas de trabalho precárias, com menos direitos, além de alterar a legislação trabalhista existente e que assegura os direitos da classe trabalhadora.

Constituição
Assim, as centrais lembram também que, segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), a inserção de matérias estranhas ao texto original de MP viola a Constituição, “notadamente o princípio democrático e o devido processo legislativo”.

A nota é assinada por Sérgio Nobre (CUT), Miguel Torres (Força Sindical), Ricardo Patah (UGT) , Adilson Araújo (CTB), Antonio Neto (CSB), José Reginaldo Inácio (Nova Central), Ubiraci Dantas de Oliveira, o Bira (CGTB), Atnágoras Lopes (CSP-Conlutas), Edson Carneiro Índio e Emanuel Melato (Intersindical) e José Gozze (Pública).

FONTE: RBA

Inovação e proteção em uma das melhores legislações do mundo no tratamento da violência doméstica

A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), que completa 15 anos neste sábado (07), tem marcado o Código Penal Brasileiro e com inovações desde sua criação até hoje, com impactos positivos na vida de muitas mulheres vítimas de violência doméstica. Sua sanção, em 7 de agosto de 2006, tornou-se um importante instrumento de proteção às mulheres e ganhou este nome devido à luta da farmacêutica Maria da Penha para ver seu agressor condenado.

Antes de a Lei Maria da Penha entrar em vigor, a violência doméstica e familiar contra a mulher era tratada como crime de menor potencial ofensivo e enquadrada na Lei nº 9.099/1995 (Lei dos Juizados Especiais).De acordo com a juíza Michelle Costa Farias, titular do Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Comarca de Santana, a Lei Maria da Penha trouxe importantes avanços, inclusive é considerada a 3ª melhor lei tratando da violência doméstica no mundo. “Uma das inovações é a retirada deste crime do âmbito da Lei 9.099, Lei dos Juizados Especiais, pois ali a violência era punida sem prisão, apenas com transações penais ou medidas de restrição, mas o clamor social pedia o agravamento das penas”, registrou a magistrada.

Outra inovação, segundo ela, é o advento das medidas protetivas de urgência. “Foi a primeira vez que o Direito Brasileiro previu a proteção preventiva em caráter de urgência, bastando a vítima procurar uma delegacia, um advogado, defensor público ou promotor e contar sua história”, explicou a magistrada. “Lembrando que não precisa ser só a violência física, mas também a moral, a psicológica, patrimonial ou sexual, e a medida de proteção previne que o agressor se aproxime e inibe o ato de agressão”, ressaltou, acrescentando que “a lei prevê a criação de rede de proteção e atendimento e a criação das delegacias especializadas da mulher”.

O juiz Normandes Antônio de Sousa, titular do Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Comarca de Macapá, acrescentou que a lei mudou e segue mudando, quando foi acrescentado no Código Penal o crime do Stalker (perseguidor), que é o indivíduo que “persegue insistentemente a vítima”. “Antes não tínhamos esse crime, o tipo penal era o Artigo 147, perturbar por acinte, mas a título de contravenção, sem nem gerar reincidência ou sujar a ficha do stalker”, observou o magistrado, acrescentando que “a perturbação continua, mas inserida no tipo penal do stalker, muito mais grave”. O juiz comentou ainda a recente sanção de uma lei que estabeleceu o crime de violência psicológica, mais um importante avanço no âmbito da proteção das mulheres vítimas de violência.

Características da Lei Maria da Penha

A Lei Maria da Penha serve para todas as pessoas que se identificam com o sexo feminino, heterossexuais e homossexuais, o que significa que as mulheres transsexuais também estão incluídas.

A vítima precisa estar em situação de vulnerabilidade em relação ao agressor, que não precisa ser necessariamente o marido ou companheiro: pode ser um parente ou uma pessoa do seu convívio.

A lei Maria da Penha não contempla apenas os casos de agressão física, também estão previstas as situações de violência psicológica como afastamento dos amigos e familiares, ofensas, destruição de objetos e documentos, difamação e calúnia.

Quem é Maria da Penha?

A história da farmacêutica bioquímica Maria da Penha Maia Fernandes deu nome à Lei nº 11.340/06 por ela ter sido vítima de violência doméstica durante 23 anos. Em 1983, o então marido tentou assassiná-la por duas vezes. Na primeira vez, com um tiro de arma de fogo, deixando-a paraplégica. Na segunda, ele tentou matá-la por eletrocussão e afogamento.

Após essa tentativa de homicídio, a farmacêutica tomou coragem e o denunciou. O marido de Maria da Penha foi punido somente após 19 anos.

FONTE: TJ AMAPÁ

Câmara aprova texto-base da privatização dos Correios. ‘Dia de luto para o Brasil’

Menos de dois meses após a Eletrobras, a Câmara aprovou nesta quinta-feira (5) o texto-base da privatização dos Correios, por meio da exploração de todos os serviços postais pela iniciativa privada. O substitutivo do relator do Projeto de Lei (PL) 591, Gil Cutrim (Republicanos-MA), recebeu plenário 286 votos favoráveis e 173 contrários. A matéria, que tramitou em regime de urgência, foi colocada para votação às pressas pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). Em um plenário esvaziado, a base do governo Bolsonaro, aliada aos partidos do Centrão, pouco defendeu a matéria. O dia foi marcado por protestos e argumentos contrários. Agora, a matéria vai ao Senado.

Com 358 anos de história, os Correios executam o direito da população ao serviço postal, garantido pela Constituição. A entrega do patrimônio nacional e o abandono da questão estratégica para o país pelo governo Bolsonaro foram rebatidas com detalhes pela oposição. Entretanto, o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ) resumiu: ” Bolsonaro deu uma entrevista recentemente e disse algo que vem cumprindo. Disse que antes de construir qualquer coisa é preciso destruir ‘o que está aí’. De fato, ele vem se dedicando a essa atividade. De desmonte, de entrega, de esvaziamento do Estado. Hoje é um dia de luto para o Brasil, para o povo brasileiro”.

A base do governo se limitou a tentar desviar o foco do que estava em votação. Líderes do PSL, incluindo o filho do presidente, deputado Eduardo Bolsonaro (SP), centraram suas falas em ataques contra as eleições. Por outro lado, Henrique Fontana (PT-RS) trouxe a pauta em votação de volta ao centro das atenções. “O governo Bolsonaro é o governo da destruição que sequer administra a compra de vacinas. Temos ministros incompetentes que sabem vender e não sabem administrar. O Brasil entra em uma situação difícil e será difícil reverter estes estragos”, alertou.

Argumentos rebatidos
Parlamentares defensores da privatização usaram argumentos rasos como “barateamento do serviço”, “quebra de monopólio estatal” ou “prejuízo para os cofres públicos”, mas foram prontamente rebatidos. Os Correios são superavitários. Dão lucro para o Estado e não possuem monopólio do serviço mais lucrativo, a entrega de encomendas on-line. “Nenhum dos 20 maiores países tem correios privatizados. É evidente que um país continental precisa ter estratégia pública de direito à comunicação. Se pegarmos os oito países que têm serviço absolutamente privatizado, os oito têm tamanho menor do que o Mato Grosso. Desafio a base do governo a contestar esses dados”, disse Marcelo Freixo (PSB-RJ).

“Os Correios deram lucro de 1,5 bilhão apenas em 2020. Privatizar os Correios amplia a desigualdade. Apenas 325 municípios são rentáveis aos Correios. Tenho respeito à iniciativa privada, mas não terão interesse (em universalizar os serviços) porque não terão lucro. Vamos tornar pessoas que dependem dos Correios para receber remédios completamente desassistidas. Temos funcionários de carreira dedicados. São 90 mil empregos diretos. Não é compatível com a verdade que vão substituir o serviço”, completou o parlamentar.

Fim da concorrência
Diferentemente do que apresenta a base bolsonarista, a privatização dos Correios não busca eliminar um monopólio, mas criar um oligopólio com alta concentração. “O STF já quebrou o monopólio do Correio. No que diz respeito ao comércio eletrônico, não há monopólio. As compras de internet são altamente lucrativas. Querem, na verdade, é tirar os Correios da concorrência das compras eletrônicas. O mercado quer cobrar o preço que quer, por isso querem tirar os Correios da concorrência. Isso vai ter alto custo para a sociedade. É uma empresa lucrativa. Pega o lucro e moderniza a empresa. Mas (o governo) não faz isso de propósito”, concluiu Freixo.

O deputado Bohn Gass (PT-RS) reforçou a fala do colega e acusou o governo Bolsonaro e o Centrão de atentar até mesmo contra a lógica capitalista, sob justificativa de beneficiar a todo custo uma elite empresarial. “Dizem que não devemos ter medo da livre concorrência, do livre mercado. Eu quero responder que vocês têm é medo da concorrência. E estão com atitude anticapitalista. Não estão defendendo a livre concorrência, estão tirando um concorrente. Estão concentrando o mercado. Se os Correios participarem do processo de distribuição postal, não vai ter oligopólio privado. Uma coisa é levar um produto de São Paulo para o Rio de Janeiro. Outra é levar para 5.570 municípios”, disse.

Quem vai pagar?
Como em mais de 5 mil municípios os Correios não têm lucros – estes são compensados nas grandes cidades –, existem riscos de aumentos abusivos nas tarifas. Também existem riscos de “apagão postal” em regiões mais isoladas. O Psol apresentou destaque ao texto do relator para tentar garantir que as taxas cobradas nos rincões do país não aumentem de forma expressiva. Para garantir isso, foi proposto um subsídio cruzado do Estado, com finalidade de garantir preços justos. A base do governo Bolsonaro rejeitou a proposta, assim como todos os destaques apresentados pelos partidos.

Mesmo serviços ao Estado, como distribuição de vacinas, remédios, provas do Enem e até mesmo o envio e recolhimento das urnas para votação nas eleições serão afetados. Isso porque o governo terá de pagar o preço que as empresas privadas cobrarem. “Nosso pequeno empresário que não é de um grande centro vai pagar mais caro. É disso que falamos. Vão concentrar e ter custo maior. Estão destruindo o Estado brasileiro para o povo pagar mais caro. O governo fala (que o povo vai) pagar mais barato. Mas está pagando ‘mais barato’ no gás de cozinha, no diesel, na gasolina? Isso é o que acontece com as privatizações. As provas do Enem, as urnas, as vacinas são transportadas pelos Correios. Eles oferecem serviços que agora serão pagos a mais”, aponta Gass.

Objetivos claros
O deputado Ivan Valente (Psol-SP) argumentou que a rejeição do governo e do Centrão ao destaque que buscava garantir o serviço postal e bancário aos municípios afastados esclarece as reais intenções em questão. “Estamos provando que essa matéria é para garantir o lucro e não o serviço. Quem vai ficar prejudicado é o povo brasileiro. O resultado da privatização é um tarifaço. Dois ou três magnatas no exterior vão lucrar atropelando os Correios.” Wolney Queiroz (PDT-PE) trouxe outros exemplos para contestar os defensores da privatização. “Dos mesmos autores do filme ‘Se aprovar reforma trabalhista aumenta emprego’. Vão aumentar os preços no sertão. Quanto vai custar uma encomenda para chegar lá?”, questionou.

Inconstitucional
Representantes do Sintect-SP, sindicato da categoria na Grande São Paulo e Sorocaba, reagiram à votação. “Perdemos a batalha, mas não perdemos a guerra. Temos muito a lutar, a debater essa situação. Não podemos desanimar. Vamos conversar com a sociedade, com nossas famílias. Perdendo aqui, seguimos na discussão”, afirmaram.

A matéria ainda será encaminhada para o Senado e parlamentares garantem que ela pode ser contestada no Supremo Tribunal Federal. Isso, argumentam, porque fere o artigo 21 da Constituição, que determina que compete à União “manter o serviço postal e o correio aéreo nacional”. “Sobre o debate dos Correios, ele é inconstitucional. Antes de debate de mérito, fere o artigo 21 da CF. Jamais poderíamos desta forma privatizar os Correios. Deixo claro que vamos recorrer na Justiça diante desta inconstitucionalidade”, antecipou Freixo.

A deputada Talíria Petrone (Psol-RJ) também apontou para a continuidade da discussão. “Entregar os Correios pro setor privado significa dificultar informativos, insumos, vacinas no interior do Brasil. Significa encarecer tarifas para quem mora distante dos centros. É inconstitucional. É serviço público e não atividade econômica. O bolsonarismo se alia a setores do Centrão para entregar o patrimônio brasileiro. É vergonhoso”, reagiu.

FONTE: RBA

Medida provisória cria trabalhador de ‘segunda classe’, reduz hora extra e atrasa aposentadoria

Uma Medida Provisória (MP) repleta de emendas pode cortar proteções trabalhistas, reduzir a renda dos trabalhadores, criar categorias de empregados de “segunda classe” e atrapalhar a fiscalização de escravidão contemporânea caso sua conversão em lei seja aprovada pelo Congresso em votação prevista para esta terça-feira (3) à tarde. Enquanto isso, as atenções do país estão voltadas às polêmicas presidenciais sobre o voto impresso, a volta aos trabalhos da CPI da Covid e as Olimpíadas.

Os “jabutis” (como são chamadas as emendas estranhas ao tema principal do projeto, inseridos no relatório final do deputado Christino Áureo – PP-RJ), transformam a MP 1045 em uma minirreforma trabalhista – prejudicial aos empregados.

A Repórter Brasil apurou que muitas das propostas foram costuradas com o relator pelo Poder Executivo, por meio de representantes do então Ministério da Economia, que hoje migraram para o novo Ministério do Trabalho e Previdência.

Editada pelo governo federal no final de abril, a medida autorizou a suspensão de contratos e redução da jornada de trabalho (com redução salarial) como forma de tentar ajudar as empresas em tempos de pandemia do novo coronavírus. Já foi prorrogada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e precisa ser votada pelos deputados federais para ser convertida em lei antes de perder a validade, em 9 de setembro. O relatório está pronto para votação no Congresso e é considerado prioridade pelo Executivo, tanto que entrou na agenda da primeira sessão após o recesso.

Contudo, os “jabutis” inseridos pelos deputados na MP 1045 são rechaçados por sindicatos, auditores fiscais do trabalho, magistrados e pelo Ministério Público do Trabalho, que divulgou na última sexta-feira (30 de julho) um documento assinado por 17 procuradores, entre eles o procurador-geral José de Lima Ramos Pereira, destacando a inconstitucionalidade de diversos pontos do relatório.

“As reduções de direitos previstas, como a possibilidade de firmar contratos civis e sem garantias trabalhistas e previdenciárias, podem aumentar muito os riscos de superexploração dos trabalhadores”, afirma o procurador do trabalho e vice-coordenador nacional da área de combate à escravidão do MPT, Italvar Medina, que é um dos signatários do documento.

“Há uma busca pela precarização do vínculo [trabalhista]. Vários países tentaram esse caminho e em nenhum lugar significou aumento do emprego e da remuneração das pessoas”, afirma o auditor fiscal do trabalho, Luiz Scienza, presidente do Instituto Trabalho Digno, entidade que reúne auditores dedicados ao estudo e pesquisa do trabalho decente.

CUT (Central Única dos Trabalhadores), CTB (Central dos Trabalhadores do Brasil), Força Sindical e outras nove centrais sindicais também repudiam as modificações trazidas no relatório. Os representantes sindicais se reuniram com o relator, mas não conseguiram sensibilizar o deputado, que faz parte da base de Jair Bolsonaro.

Procurado, o relator da MP, deputado Christino Áureo, não quis conceder entrevista.

Na justificativa do relatório, ele escreveu que: “a urgência e relevância justificam-se pela necessidade de reação do Poder Público diante da nova onda de contaminações que impediu a retomada completa das atividades econômicas, cenário em que o Novo Programa Emergencial é essencial para a sobrevivência das empresas e dos empregos, assim como para a manutenção da renda dos empregados”.

Confira as principais mudanças que podem prejudicar os trabalhadores:

Trabalhador de ‘segunda classe’ sem contrato e sem direitos

As centrais sindicais denunciam que a criação do Regime Especial de Trabalho Incentivado (Requip), defendida pelo governo, estabelece uma espécie de trabalhador de “segunda classe”, sem contrato de trabalho e, portanto, sem direitos (como férias, FGTS, contribuição previdenciária, entre outros). O Requip é destinado para quem não tem vínculo com a Previdência Social há mais de dois anos, trabalhadores de baixa renda que foram beneficiados com programas federais de transferência de renda e jovens com idade entre 18 e 29 anos.

A síntese do Requip é a prestação de serviços ou trabalho eventual associado à formação profissional, com assinatura de um termo de compromisso, mas sem caracterizar relação de trabalho. Os pagamentos ao profissional são chamados de Bônus de Inclusão Produtiva (BIP) e de Bolsa de Incentivo à Qualificação (BIQ).

“Esta modalidade de trabalho, Requip, ficará completamente à margem da legislação trabalhista, já que não haverá vínculo empregatício; não haverá salário, mas apenas o pagamento de ‘bônus de inclusão produtiva’ (pago com recursos públicos) e de ‘bolsa de incentivo à qualificação’; não haverá recolhimento previdenciário ou fiscal; não haverá férias, já que trabalhador terá direito apenas a um recesso de 30 dias, parcialmente remunerado; o vale-transporte também será garantido apenas parcialmente”, informa nota da Coordenadoria Nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente do MPT.

“Embora o objetivo ‘social’ do programa seja relevante, trata-se de um programa que promove a exploração da mão de obra, subvertendo o direito ao trabalho assegurado como direito social pela Constituição”, afirma análise do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).

Em abril, quando a MP 1045 foi discutida, o Ministério Público do Trabalho condenou a proposta: “Trata-se assim de uma modalidade de trabalho altamente precarizada, que criará uma espécie de ‘trabalhador de segunda classe’”. Em nota, o MPT destacou que não há nenhum mecanismo na MP para evitar que empregados atuais, contratados pelas regras vigentes, sejam substituídos pelos trabalhadores admitidos via Requip.

A Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados e Assalariadas Rurais (Contar) manifestou preocupação com o Requip, pois entende que pode ser um caminho para “legalizar a informalidade” do trabalhador do campo.

Redução do pagamento de horas extras

Caso a MP seja aprovada pelo Congresso, bancários, jornalistas e operadores de telemarketing, entre outros trabalhadores com jornadas reduzidas (ou seja, de menos de 8h por dia) terão redução no valor do pagamento de horas extras.

O texto do relator prevê uma “extensão da jornada” para 8 horas diárias e determina que o pagamento da hora extra tenha acréscimo somente de 20% — hoje, a legislação trabalhista determina que a hora extra tenha acréscimo de 50% (quando trabalhada de segunda a sábado) e 100% (quando trabalhada domingos ou feriados).

“É um absurdo que não deveria acontecer”, afirma a presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf), Juvandia Moreira. “Já derrotamos esse assunto em outras tentativas, mas, infelizmente, sempre retorna”, critica. Além de reduzir o pagamento da hora extra, a MP permite que a alteração seja feita por acordo individual, sem a mediação do sindicato que representa a categoria.

“A previsão de acordo individual em uma situação dessas vai contra todos os princípios que norteiam o direito do trabalho”, afirma o juiz Valter Pugliese, diretor da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). Para ele, o empregado não tem como negar o acordo se tiver que negociar diretamente com o patrão, pois a diferença de forças é muito grande. “A negociação do sindicato nessas situações é essencial”, afirma.

O MPT destaca que as jornadas especiais de trabalho para certas categorias de trabalhadores não são por capricho. “Mas em razão das condições especiais inerentes ao exercício de suas atribuições, com sobrecarga física e mental diferenciadas em relação aos demais”.

“Não se muda uma legislação consolidada sem debate público e com a categoria”, afirma a presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Maria José Braga.

Esse jabuti foi apresentado pelo deputado Eli Corrêa Filho (DEM-SP) e acatado na íntegra pelo relator, Christino Áureo (PP-RJ). A emenda prevê que a medida poderá ser aplicada também depois do fim da pandemia. “Instrumento de flexibilização e modernização da legislação laboral, com vantagens múltiplas e abrangentes dos vários segmentos interessados”, escreveu o deputado no texto da emenda.

FGTS menor para quem for demitido

Outro ponto criticado pelas centrais sindicais é usar a MP para instituir o Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Pirore), ressuscitando pontos da MP 905, que previa a carteira de trabalho Verde e Amarela.

Segundo o texto do relator, o programa é voltado para jovens adultos de 18 a 29 anos que procuram o primeiro emprego com carteira assinada e pessoas com mais de 55 anos sem vínculo formal de emprego por mais de um ano. Ambos os grupos, principalmente o primeiro, são afetados por taxas de desemprego acima da média da sociedade.

O salário-base mensal tem o teto de dois salários mínimos e, nessa modalidade de contratação, os empregados terão direitos como 13° salário e férias pagas parceladamente. Além disso, a indenização sobre o saldo do FGTS em caso de demissão também poderá ser paga parcelada e antecipadamente. O valor da multa nesse caso deixa de ser de 40% do total do FGTS e cai para 20%.

Outra perda para o trabalhador é a redução da alíquota do FGTS depositada pelas empresas, que cai de 8% para 2% para as microempresas, 4% para empresas de pequeno porte e 6% para as demais empresas. Pela regra vigente, um trabalhador que recebe salário de R$ 2,2 mil tem o depósito mensal de R$ 176 no seu FGTS. Se ele for funcionário de uma microempresa receberá o depósito de R$ 44.

“Priore é um novo nome para a Carteira Verde Amarela. São questões que precisam ser examinadas para evitar categorias de trabalhadores com menos direitos”, afirma o juiz Valter Pugliese, diretor de assuntos legislativos da Anamatra.

Fiscalização trabalhista sem multa e com ‘orientação’ para escravagistas

Um dos “jabutis” apontados pelo MPT altera a fiscalização trabalhista e prevê que antes de um empregador ser multado por infringir a lei, devem ser realizadas duas visitas dos auditores-fiscais do trabalho, mesmo para situações graves de violações, como infrações às normas de saúde e segurança (que impõe aos trabalhadores riscos de doenças e acidentes).

“Chega-se ao cúmulo de impor a dupla visita até mesmo para ilícitos verificados em casos de trabalho análogo ao de escravo”, critica o MPT.

A proposta faz uma ressalva para “irregularidades diretamente relacionadas à configuração da situação” de escravidão. Contudo, os procuradores que assinam a nota afirmam que isso é inconstitucional por que não há nenhuma irregularidade trabalhista relacionada à vítima que não esteja diretamente relacionada à escravidão e que não seja fruto de crime por parte do empregador.

De acordo com o artigo 149 do Código Penal, quatro elementos podem definir escravidão contemporânea: trabalho forçado (que envolve cerceamento do direito de ir e vir), servidão por dívida (um cativeiro atrelado a dívidas, muitas vezes fraudulentas), condições degradantes (trabalho que nega a dignidade humana, colocando em risco a saúde e a vida) ou jornada exaustiva (levar ao trabalhador ao completo esgotamento dado à intensidade da exploração, também colocando em risco sua saúde e vida). Empregadores devem usar a MP para questionar os dois últimos elementos.

Os procuradores também apontam que a proposta quer reduzir o caráter de fiscalização e tornar a atividade dos auditores fiscais como uma ação apenas orientativa. “O que pode resultar em estímulo à prática de ilicitudes e incremento de acidentes, mortes e adoecimentos nas relações laborais”, entendem os 17 procuradores que assinam a nota técnica.

“Quanto ao combate ao trabalho escravo e infantil, em particular, traria enormes prejuízos. Primeiramente porque retiraria poderes investigatórios de diversos órgãos, como próprio Ministério Público e a Polícia Federal”, afirma o procurador Medina, do MPT.

“Com isso, muitos empregadores vão esperar que um auditor fiscal do trabalho faça uma visita, oriente e, enquanto isso, não cumprem a lei”, afirma Luiz Scienza, presidente do Instituto Trabalho Digno.

Julgamento das infrações por comissão com integrantes empresariais

O relatório se vale de outro “jabuti” que sugere alterar o artigo 635 da CLT para que os recursos dos empregadores contra autos de infração passem a ser julgados por uma comissão que pode ter, inclusive, integrantes das empresas infratoras.

Para o MPT, isso submete a análise a critérios políticos de conveniência: “Com risco de fragilização da política pública de erradicação do trabalho escravo, pois também se submeteriam a esse procedimento autos de infração que consubstanciam resgates de trabalhadores”.

Na prática, caso a MP 1045 seja aprovada, representantes do governo e das empresas vão decidir se os nomes de determinadas empresas farão parte da “lista suja”, o cadastro de empregadores responsabilizados por mão de obra análoga à de escravo, por exemplo. Luiz Scienza, do Instituto Trabalho Digno, explica que essa comissão, se criada, tende a favorecer aqueles que detém o poder econômico e político no Brasil.

Isso porque a “lista suja”, por exemplo, é um incentivo às empresas a cumprirem a legislação, pois expõe o nome dos flagrados com escravizados para a sociedade, incluindo os compradores no mercado nacional e internacional e bancos financiadores.

É a segunda vez que se tenta criar uma comissão do tipo. A primeira foi no final do governo Michel Temer, em outubro de 2018.

Aposentadoria pode demorar mais tempo

Outro ponto destacado pelas centrais sindicais como prejudicial é que o trabalhador que tiver o contrato suspenso deverá contribuir como segurado facultativo (autônomo) para o INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social), seguindo as alíquotas estabelecidas para o segurado obrigatório (aqueles que têm carteira assinada). Ou seja, tira a obrigação do patrão de fazer a contribuição.

O advogado trabalhista Antonio Megale, da LBS Advogados, destaca que sem o pagamento da contribuição previdenciária, o período de suspensão do contrato não contará como tempo de contribuição para conseguir a aposentadoria — ou seja, o trabalhador terá de esperar mais tempo para ter direito ao benefício.

“Isso causará prejuízos ao trabalhador quando for requerer sua aposentadoria”, afirma. “É o empregador que deve pagar a contribuição previdenciária, e não só o trabalhador, em momento de pandemia e dificuldades financeiras, com redução salarial”, entendem as centrais sindicais.

Dificuldade de acesso à Justiça gratuita

Rechaçadas pelas centrais sindicais, as alterações de artigos da legislação trabalhista atual que recuperam dispositivos de outras medidas provisórias que já caducaram, como a MP 925 e a MP 927, também estão presentes na proposta. Uma delas altera a gratuidade da Justiça trabalhista.

O advogado Megale explica que o relatório da MP passa a exigir que seja feita a comprovação da renda para fins de acesso à justiça gratuita, sendo que atualmente, basta a declaração de insuficiência de recursos.

“O trabalhador fica com medo de entrar na justiça mesmo tendo convicção de que teve seu direito violado”, entende Clóvis Roberto Scherer, do Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos).

Inconstitucionalidade dos ‘jabutis’

As centrais sindicais destacam que a inserção de “jabutis” ao texto original de uma Medida Provisória já foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, em 2015.

A tese é corroborada pelo MPT, que aponta jurisprudência e recomenda que todos os “jabutis” sejam “apreciados em propostas legislativas específicas, que permitiriam amplo debate nas Casas do Congresso Nacional”.

A situação lembra a “boiada”, termo usado pelo então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, em reunião ministerial de 22 de abril de 2020, quando sugeriu aproveitar que as atenções da mídia estavam voltadas à pandemia de covid-19 para aprovar uma série de mudanças nas regras do setor.

FONTE: REPÓRTER BRASIL

Entenda como as empresas são obrigadas a proteger os dados do trabalhador

A Lei Geral de Proteção de Dados do Brasil (LGPD), nº 13.709/2018, foi sancionada depois de oito anos de debates, mas só entrou em vigor em setembro de 2020. E entre outros itens importantes de proteção ao consumidor, tem um item de proteção aos trabalhadores e trabalhadoras. Entenda do que trata a LGPD e qual o novo direito do trabalhador e da trabalhadora essa lei garante.


Antes de mais nada, é preciso entender que as pessoas só são perturbadas com ligações telefônicas e mensagens por WhatsApp, ou celular, oferecendo planos médicos, funerários, empréstimos bancários e vendas de diversos produtos porque seu dados foram vazados.


E esses dados podem ter sido vazados pela farmácia que pede o número do CPF, pelas operadoras de telefonia ou até mesmo por invasão de sistemas, como aconteceu recentemente no Ministério da Saúde onde hackers tiveram acesso aos dados de milhões de brasileiros.


Com os números de documentos, histórico de compras e outras informações, os bandidos podem fazer uma infinidade de falcatruas que darão muita dor de cabeça para ser resolvidas e que, muitas vezes, se arrastam por anos.


Foi por causa das inúmeras queixas que a LGPD foi criada e veio em boa hora e em contexto importante, diz o advogado Nilo Beiro, do escritório LBS. De acordo com ele, o avanço tecnológico ocorrido nas áreas da informática, coleta e armazenamento de dados, inteligência artificial e aprendizagem de máquinas nos torna vulneráveis com relação à vigilância que as grandes corporações tecnológicas e outras entidades nos submetem.
“Todos estes dados são utilizados para que nosso perfil pessoal possa ser traçado e então recebamos propagandas perfeitamente adequadas a nosso gosto pessoal”, diz Nilo. “Mais ainda do que isso, essas empresas passaram a ter dados suficientes para predizerem nosso comportamento e, ainda pior, utilizá-los para, junto com comunicação estratégica, induzirem nosso comportamento”, acrescenta o advogado.


E o que a lei trabalhista tem a ver com isso? Muito. Já tem até empresa sendo condenada por não proteger os dados dos trabalhadores após ação dos sindicatos. Embora a decisão sobre as multas sobre vazamentos só entrarem em vigor a partir do próximo mês.


Foi o que aconteceu no Rio Grande do Sul, onde os dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Alimentação de Montenegro e Região (STIA Montenegro) , no Rio Grande do Sul, que atende 7 mil trabalhadores e trabalhadores, em 19 cidades da região, entraram com 12 ações na Justiça pedindo que as empresas cumpram a Lei Geral de Proteção de Dados. A alegação dos sindicalistas foi o descumprimento sistemático na proteção de dados e o compartilhamento de informações, sem as cautelas necessárias.


A LGPD obriga as empresas a ter uma pessoa que se encarregue de ser o “controlador”, que proteja os dados dos trabalhadores, o que segundo os autores da ação, não está sendo cumprido por diversas empresas. Por isso, a Cooperativa Ecocitrus foi condenada, em primeira instância, a aplicar a LGPD, no prazo de 90 dias, sob pena de multa diária de R$ 1 mil.


A Lei diz ainda, que em hipótese alguma, o responsável pelos dados pode fornecer qualquer informação pessoal, seja médica, ou contatos do trabalhador a terceiros, nem mesmo ao plano de saúde. A empresa precisa ter autorização do trabalhador para compartilhar a informação.


“Das 12 ações que entramos, por enquanto, só a Cooperativa Ecocitrus foi condenada. A JBS e Aripê comprovaram que já estavam tomando providências. As ações contra as outras nove ainda estamos aguardando as decisões da Justiça”, diz o advogado do sindicato, Daniel Fontana.


O presidente do STIA Montenegro, Celestino Netto, que entrou com a ação, diz que é preciso tirar as empresas da zona de conforto, de que esta é mais uma lei que não será seguida.


“Nós temos quase 280 milhões de dados circulando, e é dever dos sindicatos ter este olhar de proteção para o trabalhador, que vai além do mérito apenas financeiro”, diz Celestino.


O advogado do sindicato, Daniel Fontana, concorda e alerta: “os nossos dados hoje valem mais do que o petróleo. E vimos que as empresas não estavam se adequando à legislação já em vigor. Esta é um questão que já está sendo aplicada nos EUA, Europa e em países vizinhos como Uruguai, Argentina e Colômbia, e pouco no Brasil”.


Sindicatos devem ficar atentos à LGPD
Com a nova legislação em vigor, segundo o advogado Nilo Beiro do LBS , a Lei Geral de Proteção de Dados tem importância em três esferas: pessoal, coletivo e institucional.


Segundo ele, todos temos estabelecidos direitos com relação a nossos dados pessoais e nossa privacidade, daí a esfera pessoal. Coletivamente esses direitos passam a ser importantes para as categorias profissionais e para o conjunto de todos os trabalhadores e passam a ser objeto de preocupação em toda atuação sindical.
E, por fim, é institucional, pois todas as entidades precisam se adaptar às determinações da Lei, respeitando os direitos de seus associados e associadas, dos trabalhadores e das trabalhadoras, e de todos aqueles com quem se relaciona: parceiros (imprensa, contabilidade, advocacia, fornecedores), empregados, prestadores de serviços e todos os outros. A responsabilidade quanto a isso é dos dirigentes.


“Esses direitos passam a ser importantes para as categorias profissionais e para o conjunto de todos os trabalhadores e passam a ser objeto de preocupação em toda atuação sindical”.


O advogado do escritório LBS alerta que as negociações coletivas precisam também considerar os impactos necessários da LGPD, pois diversas cláusulas habituais exigem trocas de informações entre empresas e sindicatos, como mensalidades e taxas sindicais, cursos e convênios médicos e farmacêuticos.


“Existem várias situações de compartilhamento, inclusive para a realização de assembleias e eleições virtuais, em virtude da necessidade de isolamento social por causa da pandemia. Muitas vezes quem libera os dados dos trabalhadores para que os sindicatos os chamem a participar desses eventos virtuais é a própria empresa, para que sejam resolvidas determinadas situações trabalhistas”, esclarece Nilo.


Multas podem chegar a R$ 50 milhões
O advogado Nilo Beira, explica que apesar da LGPD ter entrado em vigor em setembro de 2020, as empresas podem ser adaptar à lei a partir de 1º de agosto deste ano. A partir desta data, haverá multas pesadas de até R$ 50 milhões, caso haja vazamentos das informações por parte das empresas. Este valor mais alto poderá ser aplicado pela Autoridade Nacional Proteção de dados (ANPD), órgão ligado ao governo federal.


Dados usados indevidamente
Outros exemplos de como os dados das pessoas podem ser usados citados pelo advogado são o da empresa Cambridge Analytica, que ajudou na eleição do ex-presidente dos Estados Unidos, o conservador, Donald Trump.
Situação semelhante, explica, ocorreu nas votações do Brexit, o movimento de saída do Reino Unido da União Europeia, e também nas últimas eleições presidenciais do Brasil, quando houve uma série de disparos de fake news, o que segundo analistas, afetaram o resultado

FONTE: CUT Brasil